sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Viva eu! Viva tu! Viva o rabo do tatu!


Carlos Alberto de Lima

Cabra cega. Essa era uma, entre tantas outras, das distantes brincadeiras da gurizada da minha rua que quando o sol se punha, avivava-se para um repertório de inocentes cantigas de rodas e desejos não tão inocentes assim.
Na brincadeira do passa anel, meninos e meninas ocultavam uns pelos outros o desejo de ser castigado. De ter de pagar com o castigo de um tímido beijo: paixão segredada! ...Por isso, dona Chica, faz favor de entrar na roda... Nada contra as opções sexuais nos dias de hoje, também naqueles idos dias, opções estranhas existiam, de forma pacata, mas existiam.
Quem chegar por último é mulher do padre e ninguém queria sê-lo. Entre os da minha tribo, os guris eram machos e as gurias eram fêmeas e as paixões eram tidas entre os diferentes e apenas a amizade, e o amor em sua essência, entre os iguais.
Não é preconceito, mesmo porque eu não o tenho, era, são e serão conceitos preestabelecidos em regras que foram criadas por alguém para serem perpetuadas pelos demais.
...Diga um verso bem bonito, diga adeus e vai embora.
Dos galhos podados das árvores resultavam pequenas cavernas, para onde nos metíamos para meditações sobre o nada.
Naqueles dias a inveja, o ódio e até mesmo a raiva eram sentimentos neutralizados pela alegria. O anel que tu me deste, era vidro e se quebrou...
Com o advento da internet, do mundo ponto com, as coisas já haviam mudado. A TV e o sofá já haviam feito da sala a extensão da rua e o brilho da lua e das estrelas tornaram-se opacos.
Numa atitude insana, nos enveredamos por atalhos rumo à lei do menor esforço e ao colesterol.
Hoje não queremos mais saber com quem está o anel, do passa boi passa boiada..., da ciranda cirandinha, do dá um tapa na bunda e vai esconder, nem com quem está a feda. Hoje a onda é outra. E ninguém é obrigado a pagar mico. Viva eu, viva tu. Viva o rabo do tatu.
É. Hoje os dias são outros, porém a corrida continua e quem chegar por último continuará sendo a mulher do padre. Céus, como era inocente a inocência de meus dias.



Nenhum comentário:

Postar um comentário